No assunto da ceia, chamada de ‘santa ceia’ para alguns, precisamos ser meticulosos e entender toda raiz e pano de fundo histórico. Antes de mais nada precisamos entender que a ceia da Igreja, no Novo Testamento, é um memorial da última Páscoa celebrada por Jesus de Nazaré, pouco antes de ser traído, crucificado e morto pelos meus pecados. Em tempo: Jesus era JUDEU, praticava o JUDAISMO, portanto guardava o calendário das festas e costumes JUDAICOS. Não confundam, Jesus não era Cristão, Ele era JUDEU e é O CRISTO do Judaísmo, ainda que não reconhecido por eles como tal. Cabe um estudo sobre o que significa ser ‘O CRISTO’ mas é longo portanto outro tópico.
O princípio que serve de pano de fundo para tudo é o sacrifício. Entenda – pecado é ofensa para Deus Pai (Abba) e só pode ser pago com sangue. Não há outra forma de ‘pagar’ por um pecado, tanto que Paulo diz que o salário do pecado é a morte em Romanos 6:23. Por isso, na Antiga Aliança era necessário matar uma animal, o mais perto da perfeição possível, sem defeito nem mancha. Chegou num ponto em que isso ficou desagradável para Deus, ficou cansativo, ficou repetitivo – e o pior, perdeu o sentido e sinceridade, num tanto que o povo começou a sacrificar sem nem mesmo saber porque o fazia, sem mudança, sem arrependimento, sem santificação – virou um mero costume religioso, assim como vemos hoje em tantos grupos que se reúnem regularmente mas nada produzem. Perdeu o sentido, porque não purificava mais. A solução? Um ‘animal‘ perfeito para um sacrifício perfeito, um Cordeiro Santo para tirar todo pecado do mundo (João 1:29). Mas veja a ponte: o primeiro sacrifício, com o primeiro animal sendo morto para livrar da morte é o cordeiro (ou cabrito eventualmente) da primeira Páscoa no Egito, e o ultimo e derradeiro (ALELUIA) na última Pascoa com o Cordeiro Perfeito. Lindo…
ISTO é o que nos leva para a última ceia, que nada mais nada menos era do que a última Pascoa. Sem entender isso, nem faz sentido falar em ceia. Sem entender sacrifício, é um memorial de uma memória vazia. É um lanchinho…
Veja no texto que praticamente todo mundo usa, o que diz sobre a ceia:
Pois recebi do Senhor o que também lhes entreguei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão e, tendo dado graças, partiu-o e disse: “Isto é o meu corpo, que é dado em favor de vocês; façam isto em memória de mim”. Da mesma forma, depois da ceia ele tomou o cálice e disse: “Este cálice é a nova aliança no meu sangue; façam isto, sempre que o beberem, em memória de mim”. Porque, sempre que comerem deste pão e beberem deste cálice, vocês anunciam a morte do Senhor até que ele venha. 1 Coríntios 11:23-26
Perceberam o detalhe que diz ‘depois da ceia tomou o cálice‘ ?? Como assim depois da ceia se para nós o cálice é parte da ceia? Então… primeira falha de compreensão aqui, pois a Páscoa não era apenas pão e vinho, aliás isso era depois de outros alimentos como cordeiro assado, pães sem fermento, ervas amargas – os detalhes estão em Exodo 12. Vejam que esse mesmo detalhe nada sutil aparece em Marcos 14:22, Lucas 22:19-20 e Mateus 26:26.
O vinho da época era fermentado e tinha álcool sim. Não adianta tapar o sol com peneira, então se usamos suco de uva com uma parte razoável de elementos artificiais como corantes, açúcar, conservante – não é vinho. Igualmente, não usamos pão sem fermento e nesse ponto temos de reconhecer que o ritual católico é mais literal, pois o elemento que chamam de hóstia é um pãozinho sem fermento. Mas os evangélicos usam um pão ‘qualquer‘…
Temos aqui um ponto importante – se não fazemos questão de nos remeter a uma festa judaica, na qual todo cardápio é rigorosamente descrito, procedimentos claros devem ser seguidos, o fermento eliminado, e durante sete dias só comer o pão sem fermento… então temos de lembrar que estamos nos ajustando ao original e fazendo num formato diferente. Se não for tudo ao pé da letra, nada precisa ser ao pé da letra. Nosso pão é fermentado. Nosso suco não é vinho. Nossa ‘ceia‘ não dura sete dias e poucos grupos celebram uma vez ao ano.
Agora, quanto a quem pode tomar a ceia, no contexto cristão, lembrando que não estamos atrelados aos costumes judaicos: veja que o texto de 1 Coríntios 11 não especifica ou menciona, em qualquer lugar, nenhum tipo de restrição. O que não está proibido, está permitido… O que ninguém menciona, é que mesmo o versículo 28 diz claramente que o homem (pessoa) que se examinar tome da ceia. Adverte das consequências mas não restringe, não proíbe, nem mesmo desincentiva.
Mais um detalhe importante: Corinto era uma cidade conhecida por sua depravação moral, idolatria e diversidade religiosa, com um templo dedicado a Afrodite e mil prostitutas cultuais. A igreja em Corinto refletia essa diversidade social, incluindo judeus e gentios, livres e escravos. Portanto, se ele disse para um bando de gentios ‘tomem a ceia‘, ainda que com recomendações, ela não deveria ser para alguns ou para os especiais ou escolhidos – somente judeus por exemplo, ou somente moradores de Corinto.
O mais cruel da falta de conhecimento bíblico é o preconceito, pois veja esse texto:
O escravo comprado poderá comer da Páscoa, depois de circuncidado Êxodo 12:44
Ou seja, mesmo dentre os Judeus, nem mesmo os escravos eram excluídos da Páscoa (protótipo da ceia).
A ceia tem propósitos e mistérios específicos, lindos e transformadores:
* Nos faz um, tal como suco é unidade de uvas e pão é unidade de trigo
* Nos lembra da salvação
* Anuncia a volta de Cristo
* Oferece cura para nós pelo pão
* Nos “marca” com “sangue” para nos livrar da morte
Como nós interpretamos ? Qual o nosso entendimento? Assim:
1) a ceia é um memorial – um lembrete, um ensino a ser repassado, uma história que não pode ser esquecida. Podemos fazê-la respeitando os princípios, ainda que com formato diferente.
2) por mais que o vinho remete ao sangue por causa da cor, o mais importante ali é que é um suco feito de frutas amassadas, maceradas, espremidas. Jesus disse ‘é meu sangue‘, numa simbologia de ser espremido até sair o suco. Não é um chá, por exemplo. Isso é importante porque quando esprememos um cacho de uva para fazer o suco, as uvas desaparecem e só resta o suco. A ceia nos faz um, as uvas desaparecem junto com as diferenças entre nós, seja de tamanho, doçura, maturidade…
3) o pão é um alimento, e Jesus é o pão da vida. O princípio é de um grão (geralmente trigo) que é moído para produzir o alimento e de novo a simbologia da unificação, na qual os indivíduos desaparecem. Jesus disse ‘é meu corpo’ também simbolizando ser moído e triturado. Se pelas Suas pisaduras somos sarados, pão é sinônimo e veículo de cura para nós.
4) a ceia é um memorial do sacrifício do Salvador, então é para quem é salvo. Batismo é um ato público de profissão de fé, mas não tem relação com salvação (pessoas batizadas podem não ser salvas, como pessoas salvas podem ainda estar sem batismo). Não incentivo ficar sem batismo, aliás pelo contrário, creio e ensino que o batismo deve ser tão logo a conversão quanto seja possível. Memorial é para lembrar, então é para quem sabe não esquecer. E se quiser tomar a ceia sem certeza da salvação? O texto ensina uai, será réu de seu próprio juízo MAS não posso proibir, só devo advertir. Cada um é juiz de sua própria alma, eu pelo menos não fui constituído juiz sobre meus irmãos.
5) a ceia é o anúncio de Sua volta, ou seja, entre a primeira obra de salvação na cruz e Seu retorno consumando todas as coisas, por um lado lembramos por outro lado anunciamos. De novo, quem é salvo está apto a ter esperança na volta do Salvador. Anunciar a volta de quem nem veio (para a pessoa em questão) seria como inventar uma história.
6) não encontro base bíblica nenhuma, mas NENHUMA mesmo, para exigir que a pessoa para tomar a ceia tenha que ser batizada, membro do grupo A ou B, adulto ou criança – nada além de professar (declarar, confessar, verbalizar) a Jesus como seu Único e Suficiente Salvador pessoal. Nada mais. Nem precisa ser verdade, em essência. Se declarar isso, me vejo no papel de servi-lo pois o juízo e a responsabilidade são individuais .
7) os elementos me parecem igualmente flex. que tipo de ‘alimento’ feito de elementos moídos e que tipo de suco feito de frutas esmagadas – a mim é indiferente.
Concluo dizendo então que no meu entendimento, baseado nas Escrituras, é de que a ceia é para todas as pessoas, de todas as tribos, povos, raças e nações. Desde que declare que Jesus é o Salvador de sua vida, tome a ceia. Algum suco de fruta espremida, algum alimento de grãos moídos – estamos servidos.